sábado, 20 de março de 2010

  



 Hoje revirei o quarto por inteiro, e soube-me a canela. Salivei os apóstrofes que não se ouviam, e calquei uma vírgula perdida. Desenhei na parede um som que veio do sótão, sei lá eu porquê, e no minuto seguinte tinha já desaparecido. Bloqueei a janela por conseguinte, e alertei o gato para que não miasse. Apetecia-me uns segundos repletos de solidão e silêncio no chão rico em cera para madeira. Flutuei por entre as paredes do quarto e fechei os olhos para que aqueles segundos me parecessem mais longos e intensos. Desejei tanto que eles permanecessem ali por mais horas, que o relógio parou ali sem ponteiro.

   Com as mãos nos joelhos, inquietei-me e raspei na parede o cabelo. Centrei-me numa única imagem a preto e branco, e tentei torná-la colorida, mas em vão. Queria de qualquer jeito avisar-me de que o tempo terminara, mas eu continuava ali inocente e quieta, feito planta num vaso. Nuns minutos sentia-me lótus, noutros instantes achava-me rosa, com espinhos a oferecer a quem me quisesse tocar. Foi então que devido à variedade de sentimentos que guardava desde o inicio no bolso da blusa, despertei daquela misteriosa clave de sol e duma arte de sonhar.
   Terminou. Abri os olhos e o relógio contava as dezasseis da tarde.

Sem comentários:

Enviar um comentário